12 setembro 2011

Estória cíclica

É comum ouvir a expressão: “ a vida dá muitas voltas”, à qual faço questão de acrescentar: “ e volta a tocar no mesmo sítio”. Talvez porque tenha vivido essa experiência, ou porque tenha acompanhado quem a vive, a bem da verdade faz jus à realidade.
Oito anos passaram até ao reencontro inesperado. Ele carrega na mochila um casamento duvidosamente feliz, dois filhos que ama acima de tudo, e o olhar de quem quer absorver o mundo, porém falta-lhe a coragem, como sempre faltou. Ela, ao contrário dos boatos de um casamento e um filho, tem na bagagem amores e desamores, tristezas e alegrias, mas apresenta-se agora mulher, com vontade de ser mãe, e de construir uma relação a dois.
“- Posso falar contigo?
- Sim…
- Como estás? O que tens feito? Estás casada? Disseram-me que estavas casada e que tinhas um filho.
- Ainda não, mas hei-de ter.
- Já não moras no mesmo sítio? Às vezes olho para o estacionamento a ver se está lá o teu carro.”
E a pouco e pouco o mundo parou, e foi como se todas as outras pessoas que os rodeavam estivessem estáticas e mudas, não havia ruído, tempo, gente que os distraísse. Falaram durante horas, sobre os mais variados assuntos, ele, ela, o emprego, os filhos, o casamento, os pais, e finalmente sobre eles…
Ele que foi o primeiro namorado, o primeiro grande amor, e uma presença constante na vida dela. Ela que o conhece, vê, percebe e sente como ninguém, e quiçá por isso ele nunca a tenha abandonado por mais tempo do que o estritamente necessário.
Eles que namoraram aos 13 anos, e só fizeram amor 10 anos mais tarde.
Ela, que inconscientemente o magoou de tal forma que foram precisos 20 anos para que ele a confrontasse com esse fantasma passado. Ele, que era e é o clássico e notável amigo dos seus amigos, tão pouco conseguia discernir entre um amigo real e um lobo vestido com pele de cordeiro, e se deixou embalar por estórias imaginárias contadas por narradores duvidosos, recorda-se ainda do pormenor da roupa que ela trazia num dia específico, há duas décadas atrás.
Ela, que num surto de altruísmo abdicou do amor dele, e o convenceu a lutar por outra pessoa que não ela, enquanto sofria num choro silencioso para que ele não percebesse, porque jamais poderia aceitar o peso da responsabilidade de o persuadir a ficar com ela e de a relação não resultar. Ela que o amava mas que o deixou livre e o sujeitou a tomar as suas próprias decisões.
Já se perdeu a conta às vezes que estes ex namorados, amantes, e sobretudo bons amigos, se encontraram e reencontraram. Nesta noite tiveram sede de conversa, soltaram risos, contaram pedaços de vida, sentiram-se sem se tocarem, compreenderam-se com sorrisos e trocas de olhares, e separaram-se de novo. Sem certezas, lugares ou datas previstas para se voltarem a encontrar, ele murmura ao despedir-se: “Eu arranjo forma de saber de ti.”. Ela sorriu...e recordou-se que há 17 anos antes se tinham separado na rua ao lado. 

06 setembro 2011

Filuche

Antes de mais, um filuche é a junção entre filho e peluche. Nonsense? Absolutely... unless existam pessoas que tratem os filhos como se fossem uns peluches. Não por serem fofinhos e lhes darem muitos mimos, mas sim por os colocarem a um canto como se fossem objetos inanimados e não tivessem quaisquer necessidades de satisfação urgente.
Eu, que ainda não tive a felicidade de ser mãe, acho inconcebível esta prática de representar este papel apenas quando lhes apetece ou quando dá jeito mostrar que se tem um filho como nas filas dos hipermercados ou nos parques de estacionamento. Um filho chora com a força de um tsunami, suja a fralda como se não houvesse amanhã, fica doente por causas desconhecidas, precisa de carinhos, mimos, amor, atenção, educação, regras e de tempo, todo o tempo do mundo e mesmo assim às vezes não é suficiente. O que se passa com as mães de hoje em dia? Se queriam uma vida folgada, porque não pediram antes ao Pai Natal para lhes trazer um Tamagotchi?
Quanto a mim...agradeço aos pais e aos avós que sempre cuidaram de mim e me ensinaram que a vida (a nossa e a de quem amamos) é um bem precioso.